O ENSINO DE LITERATURA NA EDUCAÇÃO BÁSICA – CONSIDERAÇÕES ENTRE O MÉTODO TRADICIONAL E O MODERNO

Por Cristiano Mello de Oliveira

Iniciamos o nosso artigo com algumas inquietações motivadoras: Quais são as diferenças metodológicas entre o ensino tradicional e o moderno no campo da Literatura? Qual metodologia o docente deve escolher ao longo da sua jornada pedagógica de trabalho? É por meio delas e de outras que movimentaremos o nosso raciocínio e fio condutor.

Como sabemos, no Brasil, ainda vigora bastante o estilo metodológico passivo de ensino, ou seja, o método transmissivo expositivo, no qual o professor (como autoridade) domina o conteúdo e os alunos pouco questionam. Com o passar do tempo tal método foi deixado em segundo plano, devido às vanguardas pedagógicas circunstanciadas pelo próprio período histórico. A ideia aqui não é retomar desde os primórdios da Educação Básica nos últimos dois séculos, mas debater (de forma não cronológica, por completo) como chegamos ao modelo de ensino implantado nas duas primeiras décadas do século XXI. 

            Para iniciar o nosso diálogo é mais prudente que façamos uma explicação sobre a carga semântica que comporta o significado das palavras: “tradicional” e “moderno”. Delimitar o valor linguístico não significa se fechar por inteiro, mas atestar como o conceito pode se expandir para o nosso uso positivo. Sendo assim, tais pressupostos indicarão como podemos manusear os limites de interpretação e conceitos que ambos os vocábulos sugerem delimitar semanticamente. De acordo com o dicionário Aurélio, a palavra tradição: “[Do lat. Tradicione]. Sf.1. Ato de transmitir ou entregar. 2. Transmissão oral de lendas, fatos etc. de idade em idade, geração em geração” (HOLLANDA, 1986, p. 1696); por outro lado, a palavra moderno: “[Do lat. Modernu.] adj.1. Dos tempos atuais ou mais próximos de nós; recente: filosofia moderna, autor moderno.2. Atual, presente, hodierno: a vida moderna”. (HOLLANDA, 1986, p. 1146). Ora, o que nos revela é que pelo conceito de tradição: temos uma atitude voltada à transmissão oral e, de fato, isso muito representa o que uma aula expositiva significava há décadas atrás. Já pelo vocábulo moderno temos algo que corresponde à necessidade atual; uma prevalência de ser atendido aos moldes vigente e correspondente ao prático e utilitário. Em suma, salientamos que ao longo desse raciocínio, submeteremos nossas considerações, na busca de deixarmos algumas contribuições acerca de uma metodologia no ensino de literatura.   

Remando num patamar teórico e fundacional a respeito da palavra método e suas razões conceituais, no livro O discurso do método, do filósofo René Decartes, temos algumas especulações teóricas acerca do que é um método e como podemos alcançar alguns resultados. Nesta obra seminal para o conhecimento da área e do uso no curso das Humanidades, Decartes, logo no início, defende a ideia de que cada pessoa deve encontrar o seu próprio método. Sem citar as palavras “professor” ou “literatura”, o autor assevera também que desconfiar dos métodos existentes é tarefa essencial para criarmos um método de autoria própria. Nas palavras do autor: “[…] o meu desígnio não é ensinar aqui o método que cada um deve seguir para bem conduzir sua razão, mas apenas mostrar de que maneira me esforcei para conduzir a minha.” (DECARTES, 1979, p. 30). Como podemos observar, nesta expressiva passagem, o autor não está disposto a ditar uma receita pronta e sim mostrar os caminhos para chegar até esta. Linhas adiante, Decartes destaca o seu zelo pelos livros e a frequência que mantinha ao visitar algumas bibliotecas. Tomando como analogia as primeiras ideias do filósofo no livro, isso também vale para ilustrar a capacidade que temos para refletir sobre os conceitos prontos, desdobrando-os ao nosso favor. Portanto, encontrar um método seja este racional e inteligível, assim como uma voz autoral vale para o restante de nossas vidas como professor e pesquisador na área de Literatura. 

No contexto da metodologia moderna no ensino de literatura das turmas do Ensino Médio ainda se mantém formatos conservadores no trato com o fenômeno literário. No frenético anseio de dar conta da totalidade dos conteúdos arrolados no livro didático, não raro observamos professores correndo para manter a sincronia da matéria e o desenvolvimento das competências cobradas na cartilha. Não à toa, uma das formas de se fazer isso é demarcar o número de capítulos e páginas que serão trabalhados em cada bimestre ou trimestre. A proposta é justamente esta, correr com o conteúdo para não sofrer depois com os assédios morais da família do estudante, quando reclama insatisfatoriamente: “o professor não está trabalhando o conteúdo do livro e ele não está dando aula.” O dilema é ainda mais amplo porque o professor passa a trabalhar os estilos de época como se fossem vasos simetricamente articulados, quando na verdade não são. Para o crítico Fabio Akcelrud Durão: “[…] os estilos de época nunca deveriam se apresentar como um fim em si e substituir o confronto direto com os textos que nomeiam.” (DURÃO, 2016, p. 26).

Diante de um contexto contemporâneo, sem termos a necessidade de datarmos algo (relacionado ao tempo e ao espaço), e no que toca a sistematicidade do acompanhamento cronológico da literatura e suas escolas literárias supostamente sumariadas no livro didático talvez seja o assunto metodológico mais polêmico a ser discutido e debatido. Seja numa sincronia justaposta, ou seja, no tocante ao aspecto diacrônico e linear, o movimento das escolas nem sempre podem ser trabalhados desta forma. Por esse motivo, que quando o docente busca criar saltos temporais entre as escolas literárias, ele ainda observa um forte movimento de resistência frente aos pais e do próprio colegiado. Levado a cabo por diversos pontos de vista e quase todos sempre contraditórios, existem formas e maneiras de tratar o objeto literário, conforme o perfil de cada professor responsável. De todo modo, motivos metodológicos de sobra ainda buscam reclamar da autonomia governada pelo docente, pois na cabeça de muitos pais o conteúdo deve ser sempre trabalhado como se fosse um plano cartesiano – início, meio e fim. 

Embora o fio condutor de uma espécie de metodologia de formação de leitores permeie todo este subtítulo, acreditamos que é possível fazer um destaque especial sobre algumas questões no trabalho com o texto. A expressão simbólica no que tange ao aspecto de uma metodologia atual da nossa discussão é a ampliarmos o número de leitores. Por esse motivo (dentre outros), consideramos de indispensável importância que possamos introduzir, no ensino da Literatura, o levantamento de problemáticas que possam iluminar contextos articulados entre o passado e o presente do próprio leitor. Se postulássemos que todo método demanda uma proposta de ensino a ser trabalhada, o propósito seria exigir que escolhêssemos a melhor técnica de ensino. Caso o apelo à tradição fosse demasiadamente repetitivo e desgastado, o ideal é que o professor pudesse modificar a sua tática de ensino. A autora Regina Zibermann defende que:     

Adotar uma metodologia de ensino da literatura que não se fundamente no endosso submisso da tradição, na repetição mecânica e sem critérios de conceitos desgastados, mas que deflague o gosto e o prazer pela leitura de textos, ficcionais ou não, e possibilite o desenvolvimento de um posicionamento crítico perante o lido e perante o mundo que o livro traduz. (ZIBERMANN, 2018, p. 80).   

   Em síntese, esperamos que as considerações tecidas sejam úteis aos leitores – no que tange os componentes metodológicos trabalhados. Sabemos da árdua tarefa de lidar com fatores metodológicos não pode naufragar tendo em vista a dificuldade enfrentada pelos professores na árdua batalha da falta de reconhecimento e do anonimato da sala de aula. Fora do ambiente escolar cabe também ao docente uma espécie de capacitação contínua, a exemplo dos cursos ofertados pelo Ministério da Educação. Iniciativas serão sempre bem-vindas, visando despertar no docente uma voz metodológica que somente a experiência do magistério pode lhe trazer. A nosso ver, uma metodologia deve se adaptar às características pedagógicas de cada colégio (seja este seja público ou privado), e, por parte do professor, deve-se ter uma proposta de personalizar algumas formas de aprendizado através da bagagem de conhecimentos de cada aluno. Ou seja, o professor deve observar às séries escolares, o perfil das turmas, às estratégias traçadas pelo livro didático, às competências alcançadas, o projeto político pedagógico da escola, dentre outros fatores necessários.   

REFERÊNCIAS

DESCARTES, R. Discurso do método; Meditações; Objeções e respostas; As paixões da alma; Cartas. Tradução de J. Guinsburg e Bento Prado Júnior. 2. Ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

DURÃO, Fábio Akcelrud. O que é crítica literária? São Paulo: Parábola, 2016. 

HOLLANDA, Aurélio Buarque. Novo dicionário Aurélio de Língua Portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1986.

ZIBERMANN, Regina. A leitura e o ensino da literatura. Curitiba: Ibplex, 2018.

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